Exposição sobre comida provoca os sentidos
Mostra inédita reúne trabalho de grupo conhecido internacionalmente por experiências com alimentos
Comer é um ato consciente ou se limitou a ser algo instintivo, feito porque precisamos saciar a fome ou o prazer? Involuntário… sim, está aí uma boa palavra: morder, engolir, digerir (ou tentar), nada disto é opcional ao ingerirmos um alimento – o que não significa necessariamente que a gente preste atenção no que está fazendo. O que está em jogo na exposição de uma refeição? De que maneira o formato, cor e propriedades como elasticidade e resistência fazem a diferença pra mim na hora de escolher um prato? Que ruídos a gente faz quando come e qual o papel dos ouvidos no que diria respeito apenas à minha boca e nariz?
Estas foram algumas observações que não saíram de minha cabeça após reavaliar a relação que temos com a alimentação e perceber que há mais fatores envolvidos nela do que os cinco sentidos. A proposta é feita pelo estúdio britânico Bompas & Parr na mostra Cidade da Língua, em cartaz no Museu de Arte Moderna em São Paulo.
Os dez anos de trabalho do grupo foram compilados de maneira inédita. Nove ambientes compõem o cenário de uma cidade inglesa com aura antiga, para onde você é levado numa viagem incomum. É como entrar em um universo paralelo onde todos os nossos sentidos são desafiados, maximizados, para percebermos a comida de uma forma singular. Daí notamos que eles se entrelaçam mais profundamente nisto do que a gente está acostumado a pensar.
A dupla Sam Bompas e Harry Parr, conhecida por suas intervenções gastronômicas, escreve: “a experiência com os alimentos é diferente para cada um devido à genética e o ambiente”. Assim, todos os elementos da Cidade da Língua foram feitos para que cada um a sinta de maneira única, especial para cada visitante. Mas com um denominador comum, eu arriscaria dizer: a gente sai desta cidade meio estupefato, chocado até, com o que nos apresentam.
A Boca é, literalmente, o primeiro espaço da exposição. Recebida por sons de mastigação e deglutição, não consegui conter o espanto ao ouvir um arroto – mas, bem, quem nunca, né? Mais à frente, outra instalação nos permite mudar a perspectiva: uma sala inflável imita o intestino e, ao entrar, a sensação é de ser “digerido”. Um vídeo registra o passeio do alimento após ser engolido.
Passado, presente e futuro da comida são exibidos e discutidos através de diversos materiais, imagens, livros, aromas e texturas. As principais intervenções do estúdio britânico são exibidas em objetos originais utilizados por Bompas & Parr. Na Confeitaria é possível conhecer o início do trabalho da dupla, explorando a relação entre alimento e arquitetura através das experimentações com gelatinas. Na Farmácia, o futuro do alimento é abordado em seus limites éticos, tecnológicos, nutritivos e criativos.
Vale destacar ainda a Taverna, onde se “aspira” suco de frutas, uma mistura de água e aroma liberada no ambiente. Aqui vai uma curiosidade: a instalação original tinha gim na fumaça. Em outros setores da exposição o visitante pode manusear livros bem excêntricos sobre culinária e gastronomia garimpados pelo grupo – eu nem tinha ideia que publicações sobre este assunto poderiam ser tão, por assim dizer, peculiares… Também dá para assistir vídeos desenvolvidos pelos artistas para discutir as diferentes interpretações e usos da comida. Na Sala de Aula, prove chocolates enquanto ouve diferentes gravações e veja o quanto os sons interferem na percepção do sabor.
Graduados em Relações Públicas e Arquitetura, respectivamente, Sam Bompas & Harry Parr utilizam os conhecimentos de sua formação “tradicional” em um coletivo inventivo de diversas áreas para revolucionar a maneira que pensamos o alimento. O trabalho dos cerca de vinte profissionais do estúdio resulta em intervenções ousadas e inesquecíveis para quem se deixa envolver por cada experiência.
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Exposição “Cidade da Língua: Bompas&Parr”
Visitação: até 03 de setembro de 2017
Entrada: R$ 6,00 inteira – gratuita aos sábados
Local: Museu de Arte Moderna de São Paulo, dentro do Parque do Ibirapuera (próximo ao Pavilhão da Bienal)